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Um Preto-Velho e o Mar

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Nesse episódio, eu vou compartilhar com vocês duas poesias transmitidas pela espiritualidade. A primeira é uma mensagem passada por um guia espiritual que trabalha na linha dos Marinheiros e a outra mensagem é uma prece poética feita pelo Pai Antônio em homenagem à Mãe Iemanjá.

Transcrição do Episódio

E aí, galerinha do Axé! Como é que vocês estão? Está todo mundo bem? Vamos começar mais um episódio do Alma de Poeta? Eu não sei quanto a vocês, mas eu estava com uma saudade de gravar as poesias do Pai Antônio! Vocês não tem ideia de como eu me sinto nas nuvens quando eu recebo as poesias do lado de lá. E hoje eu me programei para compartilhar mais duas poesias com vocês. Bom, tem gente que chama de poesias, tem gente que chama de mensagens, às vezes eu considero verdadeiras preces. Seja qual for o nome que vocês queiram dar a elas, o fato é que esses versos vem sempre recheados de muita sabedoria, muitos ensinamentos. Meu nome é Evandro Tanaka, eu sou médium umbandista e nesse podcast a gente fala sobre Umbanda, Espiritualidade, Mediunidade e também sobre as poesias de um preto-velho.

Bom gente, a primeira poesia que eu vou passar para vocês, é uma das poucas poesias que quase não teve a participação do Pai Antônio. Ou se teve a participação dele, foi uma presença muito sutil. Eu não me lembro de ter sentido a presença dele quando eu recebi essa peosia. Porque essa mensagem foi passada por um marinheiro. O nome desse marinheiro é João.

Um dia, eu perguntei para o Marinheiro assim: O seu nome é João, né? João de quê? E ele me respondeu: Eu sou só João. O João do Mar, o João remador. Aquele que, quando em vida, passou a maior parte do tempo no colo da mamãe Iemanjá. Daí ele continuou falando: Eu tive esse privilégio, de me banhar todos os dias, nas águas sagradas, nas águas salgadas, para me fortalecer como espírito e lutar pelo meu sustento.

Daí eu perguntei para ele assim: Então você foi um pescador? E o João respondeu: Não, eu era um péssimo pescador, mas eu fui um bom soldado e um bom marinheiro. Eu sei acatar ordens como ninguém. Da mesma maneira que eu obedecia cegamente as ordens dos meus superiores hierárquicos na marinha, hoje eu obedeço as ordens dos espíritos de luz, porque nós prestamos contas ao nosso almirante maior. Aquele que desceu na Terra para ensinar as pessoas a velejar.

O engraçado, ente, é que quando o João do Mar conversa, toda fala dele faz alguma menção às coisas do mar. Todo ensinamento que ele transmite, tem alguma analogia com a vida de marinheiro. E através dessas comparações simples que ele faz, ele vai passando a sua sabedoria, a sua filosofia, os seus ensinamentos.

E essa poesia que eu vou recitar para vocês agora traz justamente essa comparação. A gente tem que ouvir e saber interpretar as palavras simbólicas que o marinheiro fala. Vamos ouvir a poesia?

Quando a vida se tornar
demasiadamente pesada
e teus olhos afundarem
no imenso mar de lágrimas,
lembra-te que o peso
da âncora é necessário
para não deixar
à deriva a embarcação.

Quando os ventos fortes
trouxerem a tempestade,
recolhe a vela do mastro
e enfrenta a adversidade.
Mas saiba que a força
dos ventos é importante
para fazer conduzir
mais rápido a embarcação.

Quando o sol se deitar
sereno no horizonte,
trazendo a escuridão
assustadora da noite,
olha para as estrelas
que te fazem companhia
como fiéis sentinelas,
servindo-te de guias.

Eu trago a simplicidade
de um marujo sem instrução.
Não sei usar as palavras,
só falo de embarcação.
Do mundo, não levei nada
apenas a longa jornada
que me trouxe a reflexão.

Sou um simples marinheiro
que viveu no mundo profano.
Da vida não conheço muito
mas entendo do ser humano.
Já vivi tormentas no mundo
em erros e desenganos.
Já naveguei pelo mar revolto
e pelas águas dos oceanos.

Não é linda essa mensagem que ele passou, gente? Uma mensagem cheia de simbologias e cheia de verdades. Obrigado, João, por direcionar o leme do meu barco da maneira certa. Nessa poesia, o João fala do comportamento que nós devemos frente às dificuldade que nós enfrentamos na vida.

Logo no começo da poesia ele fala uma passagem muito bonita. Quando a vida se tornar demasiadamente pesada e teus olhos afundarem no imenso mar de lágrimas, lembra-te que o peso
da âncora é necessáriopara não deixar à deriva a embarcação. Não é lindo isso?

Todos nós enfrentamos problemas na nossa vida, todos nós passamos por dificuldades, todos nós nos afogamos em mar de lágrimas, de vez em quando. Porque isso faz parte do nosso crescimento interior. Mas o João fala que quando isso acontecer, a gente precisa jogar a âncora, a gente precisa se firmar, para não deixar a nossa vida seguir à deriva, sem rumo certo. Porque é nos momentos difíceis que muitas pessoas acabam se perdendo, que muitas pessoas acabam se desesperando.

O João fala na poesia, que nessas horas, quando a tempestade estiver caindo nas nossa vidas, a gente precisa jogar a âncora e recolher as velas da embarcação. Porque os marinheiros sabiam que as tempestades fortes acabavam rasgando as velas do navio. E depois, com as velas rasgadas, o barco não conseguia seguir para lugar nenhum, porque ele não podia mais aproveitar a força dos ventos.

Por isso que o marinheiro falou na poesia que, em tempos de adversidade, a gente precisa recolher as velas da nossa vida e ficar quietinho, esperando a tempestade passar. Aí depois que terminar aquele momento difícil, daí sim você estende novamente aquela veja gigante que vai conduzir o seu barco até um porto seguro.

Porque os marinheiros sabiam, naquela época, quando ainda não existia motor, que a força dos ventos era importante para o barco se movimentar. Porque naquela época, antes da industrialização, o marinheiro só tinha duas alternativas: ou usar a força dos ventos para o barco se movimentar sozinho, ou entao remar. E é lógico que, nas grandes navegações, não dava para atravessar o oceano remando, né?

Tem uma outra parte muito bonita da poesia que fala assim: Quando o sol se deitar sereno no horizonte, e vier a escuridão da noite, olha para as estrelas que te fazem companhia. Se tem uma coisa que os marinheiros conhecem muito bem é a solidão. Porque pensa, gente, não era brincadeira ficar meses e meses em cima de um navio em alto mar. Imagina quantas e quantas noites esses marinheiros não sofreram saudade de casa, da família, dos amores…

E se tem um sentimento em nós que os marinheiros entendem muito bem, é esse sentimento de solidão. Eles aprenderam a lidar muito bem com isso e eles são exímios conselheiros quando se trata de solidão. O João costuma dizer: “quando você estiver se sentindo sozinho, olha para o céu! Tem um universo inteiro te fazendo companhia!

E gente, eu vou falar uma coisa para vocês: a solidão só existe dentro da sua mente. A solidão independe de fatores externos. Vocês já viram monges que ficam enclausurados nos mosteiros, na solidão de uma cela? Pergunta se eles se sentem sozinhos? Eles vão dizer que não, porque eles sentem a completude do prório ser. Eles já superaram essa limitação da nossa mente de sentir solidão.

Por outro lado, vocês veem pessoas, muitas vezes rodeadas de uma multidão e mesm assim, elas se sentem só. Isso acontece muito em grandes centros urbanos, como é o caso aqui de São Paulo. Como que você explica isso? O sujeito pode viver rodeado de pessoas e mesmo assim ele ainda sente solidão.

Eu acho que a maior lição que o João Marinheiro trouxe para mim até hoje foi essa: a de me bastar no meu próprio ser, de me realizar com a minha presença.

Mas gente, eu estou falando isso, mas não é para a gente se isolar do mundo também, né! Não é para a gente se isolar das pessoas. Ah, já que eu me basto em mim mesmo, eu não preciso de ninguém! Não é assim! O que eu quero dizer é que o fator externo serve apenas como um complemento daquilo que já deveria existir dentro de você.

Você se sente bem com você mesma? Você se sente feliz com a sua própria presença? Então, a presença de outras pessoa vai amplificar ainda mais essa sua felicidade. Vocês percebem? É uma amplificação daquilo que já existe dentro de você.

Nossa! Me deu uma vontade agora de ouvir um ponto de marinheiro! Deixar eu procurar um ponto aqui para tocar.

[ponto de marinheiro]

Vem marinheiro, dá licença de passar, de passar. Seu navio entrou no porto. Ele vem de alto mar. É bonitinho esse ponto, né? Salve a linha dos marinheiros! Salve a marujada!

E como a gente está falando de marinheiro, de mar, eu vou aproveitar e recitar uma outra poesia que eu recebi do Pai Antônio. Essa poesia é uma verdadeira prece. Uma demonstração de amor e respeito pelo local sagrado dessa maravilhosa Orixá.

Eu lembro que quando eu recebi essa poesia, o Pai Antônio disse assim para mim: “Filho, fecha os olhos que eu vou mostrar para você o que eu vi”. Eu fechei os olhos e eu me vi transportado para uma praia deserta de areias branquíssimas e com um mar esverdeado na minha frente. Eu não sei explicar direito o processo que aconteceu, mas eu estava olhando aquela paisagem com os olhos do Pai Antônio. E eu percebi que ele estava ajoelhado na orla do mar, fazendo essa oração linda que eu vou compartilhar com vocês agora:

Oh, doce Mãe que nos irradia
ondas suaves de poesia
permeadas de tanto amor!
Meu coração, cheio de alegria,
por estar em tua companhia,
agradece ao Pai Criador!

Doce Mãe de eterna bondade,
na grandeza da tua humildade,
eu me curvo com todo o carinho.
Em teu mar de serenidade,
eu fortaleço a minha vontade
para permanecer no caminho!

Oh, doce Mãe, senhora da vida,
que cuida da minha alma sofrida
e transforma dor em aprendizado;
derrama tua água abençoada,
lavando a minha longa jornada
e purificando-me do pecado!

Oh, Mãe, de infinitos encantos,
dona de conhecimentos tantos,
eu me entrego em teu mar de amor,
nessas águas de puro esplendor!

Nossa! Eu estava lendo essa poesia agora e eu me emocionei novamente lembrando das cenas que se passaram na minha cabeça. Que visão maravilhosa ver um preto-velho, vestido de branco, com o seu corpo todo iluminado, parecendo um raio de sol, rezando para Deus, rezando para mãe Iemanjá.

Naquele dia, o Pai Antônio me confidenciou uma coisa. Ele disse que por duas vezes apenas, na vida dele, ele teve a oportunidade de ver o mar. Uma foi quando ele foi trazido, ainda criança, em um navio negreiro, sofrendo, apanhando, passando fome…

E depois, quando ele já era velho. Ele conta que teve uma vez, que a sinhazinha, de quem ele gostava muito, como se fosse uma filha, adoeceu gravemente. E ela já estava nas últimas quando o pai dela, o senhor dos escravos, veio desesperado para o Pai Antônio perguntando se ele podia fazer alguma coisa com as simpatias que ele fazia para tratar os outros escravos. Porque os médicos da cidade não conseguiam descobrir o que menina tinha.

E o Pai Antônio conta que ele passou noites e noites rezando, velando, fazendo suas preces para os Orixás, fazendo banhos de ervas, pedindo ao nosso Pai Antônio Olorum que devolvesse a vida para aquela menina.

E aos poucos, a menina foi melhorando, foi restabelecendo a saúde até se curar totalmente daquela enfermidade. E o pai dela, com um profundo sentimento de gratidão pelo Pai Antônio, disse que ele podia pedir o que ele quisesse. “Nêgo, fala pra mim o que você quer que eu vou realizar. Pode pedir qualquer coisa”.

E o Pai Antônio, acabrunhado com aquele rompante de generosidade do senhor das terras, disse assim: “Sinhô, se não for abusar muito da vossa mercê, nêgo pede a permissão de poder visitar o mar, que nêgo só viu uma vez na vida quando era pequeno e que nem se alembra direito”.

E daí, o senhor das terras ficou surpreso, porque pensava que o Pai Antônio ia pedir a liberdade dele. Daí ele perguntou assim: “você tem certeza, nêgo? Porque se você quiser ser livre, eu te dou a carta de alforria”.

E o Pai Antônio abaixou a cabeça e falou assim: “Nêgo não quer ser livre, não senhor. Nego quer continuar cuidando da vossa família, até quando o nosso senhor Jesus Cristo permitir”. E foi assim que o Pai Antônio recebeu a permissão de visitar o mar, pela segunda vez, quando ele já era velho. E ele disse que se emocionou muito quando ele viu aquelas águas que, há tantas décadas atrás, trouxe ele para uma terra de tanto sofrimento.

Esse é o Pai Antônio. Esse é mais um pedacinho da história dele. Saravá, meu pai! Salve a sua força, salve a sua luz!

[ponto – navio negreiro]

Então é isso, gente! Esse episódio que eu gravei me trouxe muitas lembranças. Recordações adormecidas. Espero que vocês tenham gostado, desculpem a minha emotividade. São por essas e outras que eu amo tanto a Umbanda, que eu amo tanto os Orixás e essa espiritualidade maravilhosa que nos acompanha.

Hoje eu não vou encerrar o episodio como eu sempre faço, não. Hoje eu vou encerrar o episódio apenas agradecendo a vocês por ouvirem essas histórias que eu compartilho, por dedicarem um pouquinho desse tempo escasso de vocês, com essa vida corrida que a gente tem, para ouvir o Alma de Poeta. Isso me deixa muito feliz.

Por esse carinho todo, o meu muito obrigado!

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