Um episódio de intolerância religiosa na história do Brasil.
No dia 2 de fevereiro de 1912, Maceió viu o maior e mais cruel evento de intolerância religiosa no Brasil: a quebra de Xangô, um ataque paramilitar que destruiu 150 casas de religiões de origem africana na cidade. O líder do ataque foi Fernandes Lima, um político local que opunha-se ao governador na época, Euclides Malta.
Ninguém foi punido pelo ataque e Fernandes Lima ainda ocupou cargos importantes, como vice-governador, deputado federal e senador. Além disso, ele tem uma avenida principal com seu nome em Maceió.
Mas agora, mais de 100 anos depois, a homenagem pode ser retirada. O Ministério Público de Alagoas criou uma comissão para avaliar se o nome da avenida está de acordo com a ética histórica e os direitos humanos. A Quebra de Xangô foi uma destruição violenta de terreiros e perseguição a seguidores e líderes de religiões africanas.
O antropólogo Ulisses Neves Rafael confirma que, em suas pesquisas sobre perseguição a esses cultos no Brasil, ele não encontrou nenhum evento tão violento quanto o dia da Quebra de Xangô.
Os promotores acham que não é certo ter uma rua importante em Maceió com o nome de Fernandes Lima, um dos responsáveis por um evento cruel de intolerância religiosa ocorrido em 1912. Os promotores disseram que o Estado Brasileiro mudou muito e agora proíbe discriminação ou preconceito baseado na raça, cor, religião, etnia ou nacionalidade.
Fernandes Lima era político e não gostava de religiões de matriz africana. Naquela época, muitas pessoas achavam que essas religiões eram bruxaria. Agora, o Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial quer mudar o nome da rua. Eles vão chamar pessoas importantes, como representantes de organizações sociais e políticos, para discutir o que fazer.
Na época, a vítima principal da história foi Tia Marcelina. Ela foi espancada e morreu dias depois. Além disso, cerca de 150 casas de religião de origem africana também foram destruídas pelos atacantes.
Tia Marcelina era escrava de Angola e descendente do Quilombo dos Palmares. Ela ajudou a fundar as primeiras religiões de origem africana no Brasil, em Maceió. Hoje, há, inclusive, uma delegacia especial que leva seu nome para investigar crimes contra pessoas vulneráveis. Todos os anos, há uma cerimônia para relembrar o episódio.
Após o trágico evento em Maceió, as pessoas que seguiam religiões de origem africana rezavam em silêncio por medo de serem atacadas.
Em 2012, o governador Teotônio Vilela fez um pedido oficial de perdão à sociedade de Alagoas, especialmente às pessoas que seguem essas religiões. Depois disso, as pessoas se sentiram mais seguras para se assumirem publicamente e usarem suas vestes típicas.
Clébio Araújo, um professor e pesquisador de história, diz que esse evento foi importante porque deu mais visibilidade a essas religiões.
A história de intolerância religiosa que o Brasil ignora
Em 2 de fevereiro de 1912, como em todos os anos, havia uma festa nos terreiros de Maceió para homenagear Iemanjá. Mas naquele dia, uma milícia veio e destruiu cerca de 150 casas de religiões africanas na cidade. Isso é conhecido como a “Quebra de Xangô” e é visto como o ataque mais violento contra religiosos na história do Brasil. Uma mãe de santo foi espancada e nenhum terreiro sobreviveu. Muitos pais de santo precisaram sair de Maceió.
A milícia responsável pelo ataque pertencia à Liga dos Republicanos Combatentes, criada por um candidato a vice-governador opositor chamado Fernandes Lima. Eles perseguiam pessoas que não apoiavam o Partido Republicano.
Sem sombra de dúvidas, esse foi o ataque religioso mais violento já registrado na história do Brasil. A líder Tia Marcelina foi espancada e morreu depois disso. Ela é lembrada como uma heroína até hoje. O ataque afetou negativamente a cultura negra na cidade, fazendo com que algumas expressões culturais importantes desaparecessem.
A professora e historiadora Gabriela Torres escreveu um livro chamado “Os intelectuais alagoanos e o Quebra de Xangô de 1912: uma história de silêncios”. Ela acredita que o ataque foi uma tentativa de calar a voz dos pobres em Alagoas e no Brasil. É importante conhecer a história, mas muitas pessoas não sabem sobre o ataque. Isso dificulta a criação de uma memória crítica sobre como a sociedade errou com as pessoas negras.
Segundo Gabriela, o ataque foi resultado de uma ideia de “branqueamento”. Os estereótipos negativos sobre a cultura negra ajudaram a criar uma identidade nacional excludente e racista. Ela também acredita que o Estado é responsável por alguns desses ataques. O desconhecimento sobre esse ataque impede que o tema seja estudado para evitar a repetição de eventos parecidos.