Pesquisar

A Linha dos Boiadeiros na Umbanda

Ouvir episódio

O boiadeiro é a figura do peão sertanejo, do homem que viveu da lida do campo, do homem que viveu da criação de animais, do homem que desenvolveu muita força e habilidade para lidar com as adversidades da vida.

Transcrição do Episódio

Olá, povo da Umbanda! Galerinha do Axé! Recebam todos o meu caloroso abraço e sejam bem-vindos a mais esse episódio do Podcast Alma de Poeta. Meu nome é Evandro Tanaka, eu sou médium umbandista e aqui é um lugar onde a gente conversa sobre Espiritualidade, Mediunidade e também sobre as poesias de um querido preto-velho. No episódio de hoje, a gente vai conversar sobre uma Linha de Trabalho que é muito querida na Umbanda! A gente vai falar um pouquinho sobre a Linha dos Boiadeiros.

Bom, boiadeiro aqui no Brasil, todo mundo sabe o que é, né? Eu acho que se a Umbanda tivesse nascido nos Estados Unidos, a Linha dos Boiadeiros seria conhecida como “Linha dos Cowboys”. Porque Boiadeiro é aquele espírito que, quando em vida, lidava com gado, trabalhava no campo, vivia nas zonas rurais mais remotas do nosso país. Boiadeiro é o matuto, o caipira, o bicho do mato. Boiadeiro é aquela pessoa que, quando estava encarnado, gostava de ficar isolado na natureza. Gostava mais da natureza do que da cidade. Boiadeiro é aquele cara que se dá melhor com bicho do que com gente.

Talvez seja por esse motivo que os boiadeiros têm aquele jeito meio arredio. São Entidades de poucas palavras. Essa é a maneira como os boiadeiros se manifestam na Umbanda. Porque eles, assim como os Caboclos, falam o mínimo necessário. Afinal de contas, os Boiadeiros estão acostumados a conviver com animais, não é? E para viver no meio de animais, não precisa falar muito. E é por isso que os Boiadeiros, assim como os Caboclos, são espíritos de poucas palavras e de muitas atitude! Eles não falam, eles vão lá e fazem!

E os pontos cantados de boiadeiros… adivinha só? Falam sobre o quê? A maioria fala de boi, boiada, fenômenos climáticos, tempestades. Os pontos cantados de boiadeiro falam de laço e o chicote, porque esses são os instrumentos que eles usam para os trabalhos espirituais. Vamos ouvir um ponto de boiadeiro aqui para entrar no clima? Jetruá, povo boiadeiro! Xêtro marromba Xetrô! A corda é de laçar o boi!

O boiadeiro é a figura do peão sertanejo, do homem que viveu da lida do campo, do homem que viveu da criação de animais, do homem que desenvolveu muita força e habilidade para lidar com as adversidades da vida.

E justamente por essa experiência que eles tiveram na matéria, de lidar com muitas dificuldades, de ter tido uma vida dura, nessa linha de trabalho, costumam se manifestar espíritos que usam seus conhecimentos para auxiliar aquelas pessoas que estão passando por momentos de dificuldade. Os Boiadeiros, através do estalo do chicote, do couro zunindo no ar, eles conseguem promover “uma espécie de limpeza” no nosso campo energético e, com isso, eles vão dissipando o acúmulo de energia negativa. Por isso que quando vocês veem os médiuns incorporados com boiadeiros, muitos deles parece que estão rodopiando um laço ou estalando um chicote. O médium, na verdade, está repetindo os movimentos que a Entidade está fazendo. E a Entidade realmente está manuseando esses intrumentos de trabalho.

É lógico que, assim como nas outras linhas da Umbanda, nem todos os espíritos que se manifestam nessa força foram, de fato, “boiadeiros” a vida encarnada, mas todos eles têm em comum a capacidade de atuar num campo energético específico que caracteriza essa linha. O espírito do boiadeiro traz uma energia vigorosa, uma energia muito forte que ajuda a diluir cargas negativas, ajuda a desfazer magias negras. A energia do boiadeiro tem o poder de desfazer cristalizações mentais das pessoas, desfazer pensamentos obsessivos.

E os boiadeiros chegam no terreiro, chegando! Eles tem uma presença muito marcante!

É galera! Abre a gira de Umbanda que boiadeiro chegou!!! E eles chegam com força, com intensidade!

A linha de boiadeiros é sustentada pelo poder de dois Orixás: o primeiro é Ogum. Por isso, eles têm essa força que se compara à força de um “soldados”. Eles vigiam tudo e todos, eles protegem, eles tomam conta, assim como fazem os Caboclos de Ogum. E ao mesmo tempo, eles estão prontos a acudir os necessitados. E o segundo Orixá que sustenta a Linha dos Boiadeiros, na verdade é uma Iabá: é a nossa Mamãe Iansã, que faz ventar a força da mudança, que faz movimentar as energias, que tem o poder de reerguer a consciências dos espíritos negativados, que reequilibram aqueles que se perderam… É nesse sentido que os Boiadeiros trabalham para recolher e para encaminhar os espíritos para os seus locais de merecimento. E não pensa que boiadeiro leva só para local bom, não, viu! Ele também leva para locais ruins. Vai depender muito do seu merecimento.

Vocês percebem aqui a função típica de um boiadeiro? É a atividade de conduzir as pessoas em segurança pelos caminhos da vida. Na linguagem dos boiadeiros espirituais, eles chamam as pessoas de “boi”, os seres humanos encarnados e desencarnados que estão em desequilíbrio. E eu não sei vocês, mas eu me sinto ainda um espírito em desequilíbrio. E enquanto eu me sentir assim, eu vou precisar da ajuda de um boiadeiro que me conduza pelo caminho reto. E eles são especialistas nisso!

E um boiadeiro, ele não se conforma em perder um único boi da sua boiada! Onde quer que ele esteja, ele volta para buscar. Porque ele fala que o boi não é dele, mas sim do patrão que contratou ele para fazer o serviço. E o patrão, quem que é? Jesus! Quando eu recebo o boiadeiro, o Guilhermino, ele fala para mim assim: “Eu faço o meu trabalho e faço muito bem feito, porque eu estou sendo bem pago para isso! Oxalá me contratou e eu tenho que fazer por merecer o salário que eu recebo!”. E ele até brinca: “E graças à generosidade de Oxalá, eu tenho um padrão de vida muito bom aqui no plano espiritual. Graças ao salário que eu recebo conduzindo a boiada!”.

Os boiadeiros conduzem a boiada e conhecem a característica de cada boi. Eles sabem que uns são mais mansos, outros são mais arredios, outros são traiçoeiros. E eles lidam com os bois de acordo com a personalidade de cada um. O que eu quero dizer com isso? Que os boiadeiros conhecem os nossos defeitos. E às vezes eles têm que estalar o chicote para que a gente se mexa, para que a gente continue a nossa caminhada.

E da mesma maneira que os boiadeiros guiam os encarnados, eles também tem a capacidade de direcionar espíritos estagnados no erro, que estão na estagnação. No plano espiritual, através da disciplina do chicote e do laço do boiadeiro, eles conseguem colocar ordem e impor respeito aos kiumbas, aos espíritos endurecidos no mal.

E os boiadeiros são guias espirituais que valorizam muito a natureza. Eles trabalham incessantemente para que haja um equilíbrio entre o ser humano e o meio ambiente. No plano espiritual, os boiadeiros trabalham muito no mental das pessoas, intuindo elas a explorar a natureza de uma maneira sustentável. Porque os boiadeiros amam a natureza, da mesma maneira que os Caboclos, com a mesma intensidade, e fazem de tudo para preservar ela.

E os boiadeiros, apesar daquela aparência agressiva, daquela intensidade fluídica com que eles se manifestam, são espíritos muito evoluídos, e eles tem uma ligação forte com a fauna. Eles tem um amor intenso pelos animais. Apesar dos boiadeiros terem um comportamento, às vezes, truculento, eles são portadores de uma generosidade sem tamanho! Eles se desdobram em atenção para tentar ajudar as pessoas. São espíritos muito benevolentes.

E assim, os boiadeiros na Umbanda são guias espirituais que trabalham nas linhas auxiliares. Vocês lembram que eu já falei sobre isso? As Linhas Principais são preto-velho, caboclo e criança. E depois, todas as outras são consideradas linhas auxiliares, tão importantes quanto as linhas principais. É nessa classe que se inclui os boiadeiros. Tem terreiro que boiadeiro desce junto com baiano. Tem terreiro que boiadeiro desce junto com Caboclo. Mas os boiadeiros pertencem a uma linha bem específica. Porque eles tem características própria. Os boiadeiros têm o seu próprio arquétipo. Vamos ouvir mais um ponto de boiadeiro? Abre a porta, mamãe! Deixa o boiadeiro passar!

Quando esse ponto fala “Abre a porta mamãe, deixa o boiadeiro passar”. Que mãe é essa que ele está se referindo? O ponto está se referindo à mamãe Iansã. A energia renovadora que sustenta a linha dos boiadeiros. Abre as portas do céu, mamãe Iansã, com o teu raio. E deixa passar essa falange de boiadeiros pela sua porteira, para que eles possam vir nos ajudar aqui na Terra!

Bom, gente, mas vamos lá! Continuado… na época em que os boiadeiros eram vivos, eles trabalhavam em contato direto com a terra, com a natureza. E eles dominavam a arte de trabalhar no campo. E os boiadeiros aprenderam a lidar muito bem com o instinto dos animais. É por esse motivo que eles conseguem controlar os animais como ninguém. E eles tem um amor muito grande por esses nossos irmãozinhos menores. É um amor que impressiona!

E além disso, os boiadeiros são muito acostumados às adversidades climáticas, né? Por isso que, os Boiadeiros na Umbanda, são conhecidos por conseguirem trazer prosperidade até para as situações mais improváveis. Eles gostam de trabalhar com a adversidade da vida. Eles gostam de enfrentar os desafios da natureza.

E eu não sei se vocês já tiveram a oportunidade de conversar com um boiadeiro incorporado, mas eles tem uma fala muito simples. Muitas vezes eles usam um vocabulário de matuto mesmo! Mas através daquela fala simples, eles dão conselhos maravilhosos! Eles transmitem ensinamentos sobre a complexidade da vida de uma maneira muito singela, sempre aconselhando no caminho do bem! Porque os boiadeiros têm um coração enorme. E sempre que podem, eles querem ajudar, orientar, aconselhar.

Através daquela linguagem característica do campo, eles conseguem transmitir mensagens de paz e de amor. É o ensinamento de um vaqueiro que tem a sua maneira própria de se comunicar com as pessoas. Quando você olha para um Boiadeiro em uma gira na Umbanda, você pensa logo em um peão, em um domador. E eles realmente tem esse laço profundo com os animais, como eu já disse antes.

E da mesma maneira que os boiadeiros sabem controlar uma boiada no pasto, eles também controlam como ninguém o ambiente espiritual onde eles estão. Eles conseguem conduzir os espíritos mais arredios, usando a disciplina. E através dessa disciplina e dessa força que eles possuem, os boiadeiros conseguem retirar com bastante facilidade espíritos obsessores que, eventualmente, possam estar prejudicando alguma pessoa encarnada.

E eles fazem tudo isso com muita humildade, com aquela modéstia… Sabe aquela modéstia típica do sertanejo, beirando, às vezes, até a timidez. Mas não se enganem, porque o jeito acanhado dos boiadeiros esconde uma grandeza espiritual enorme! Por isso eles são muito respeitados pela espiritualidade nos terreiros de Umbanda.

Alguns boiadeiros, quando incorporam, trazem uma fisionomia um tanto quanto “carrancuda”, mas depois que a gente começa a conversar com eles, é que a gente percebe a amorosidade que eles carregam! A presença de um boiadeiro nos transmite segurança, e ao mesmo tempo nos transmite conforto, carinho.

E eu quero terminar esse episódio aqui com um ponto que eu acho lindo. Um ponto que é uma verdadeira prece ao povo boiadeiro.

Meu amigo Boiadeiro! Tu que guia teu gado pelas porteiras dos caminhos de Ogum, Tu que passa por rios, sob a inclemência do Sol e da chuva com seu berrante a anunciar Tua chegada, Tu, que com o teu chicote em punho corta as energias negativas, a sua habilidade com o laço não deixa eu me perder no caminho da vida. Ajuda-me nesta hora, boiadeiro, abre as porteiras para que eu possa caminhar livremente pelos pastos verdejantes do nosso Pai Oxalá! Segura no teu laço aqueles que me querem o mal. Que na Tua chibata haja justiça. E que na sua luz eu encontre a solução para os meus pedidos.

E com essa música maravihosa eu me despeço de vocês. Que o nosso Pai Ogum e a nossa Mamãe Iansã abram o caminho de vocês. Que a força dos boiadeiros esteja presente na vida de cada um! Jetruá, boiadeiros!

Deixe seu comentário

11 comentários

Mais deste assunto

Episódio 67
Nenhum número escolhido ainda